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sábado, 14 de junho de 2014

Copa do Mundo 2014 é a coisa mais linda que já aconteceu no Brasil


   Cheguei a achar que estava tudo perdido. Que o que fizeram com essa Copa e a divisão ideológica na qual meteram o país iria acabar de vez com todas as esperanças de esse se tornar aquele tão sonhado e propalado país do futuro. Mas agora eu percebo, tudo o que está acontecendo pode ser só um sintoma, a tempestade que precede a bonança. É só o Brasil sendo o Brasil.
   Nos anos 80 tudo o que se relacionava ao Brasil era tosco. Era frustrante pra mim, como criança, ir descobrindo que todas as coisas que haviam no mundo e que me interessavam em nosso país eram sempre inferiores. Diziam que nosso cinema era só "filme infantil e putaria". Nos filmes brasileiros que via identificava sempre uma precariedade, adorava os filmes dos Trapalhões, mas percebia decepcionado que eles eram bem inferiores aos americanos. Na infância, não me interessava muito por música, mas quando despertei o interesse, vi o quanto os ingleses e americanos eram bons, e não foi exatamente amor a primeira vista meu sentimento para com a MPB quando a conheci, eu tive que aprender a saboreá-la e a digeri-la, e era uma sensação chata ter que passar por isso. Me frustrava muito quando ia assistir à um raro desenho animado nacional seus movimentos estranhos, simplórios e a história e o humor que nunca agradavam. 
 
   E mesmo criança, a gente sacava que a economia e a política no Brasil eram um grave problema. Nunca se tinha dinheiro pra nada. Ficava nas lojas de brinquedo namorando os carrinhos e bonecos de super-heróis, e ficava enormemente frustrado por que meus pais nunca podiam comprar nada do que eu sonhava, quando podiam me dar alguma coisa era sempre algo bem mais simples e barato. Estudei com crianças que colocavam os cadernos que haviam ganho do governo em sacos de arroz. Era muito caro comprar mochilas. Todo mundo de vez em quando tinha piolho e todo mundo sabia que nos EUA e na Europa a vida era bem melhor. Aqui tudo era ruim. Só quem viveu a época sabe o quanto era especial o dia que tinha refrigerante no almoço, geralmente nalguma festa em família. 
  Entretanto, ao mesmo tempo que ia tomando consciência da precariedade em que vivia meu país, ia percebendo que pelo menos em um quesito, o mundo respeitava o Brasil. E dada a situação em que se vivia isso era algo que tinha uma dimensão, uma importância. Pelo menos uma coisa no gigante e pobre país era realmente boa, e podíamos ter orgulho disso.
   E essa percepção ia crescendo e se consolidando. Servindo de consolo a medida que amadurecia. Até que em 1990, com 10 anos de idade fui assistir minha primeira Copa. Acompanhei 86 distraidamente, mas nessa estava mais antenado. Assim, assistindo a primeira fase da competição, fui me dando conta jogo a jogo da importância daquilo que tinha diante de mim na televisão. Quando o Brasil fazia um gol meu pai se levantava do sofá, erguia os braços e gritava "gol!!" Nunca havia visto meu pai manifestar tanta emoção e alegria para nada. Me surpreendia e me contagiava com aquilo. Claro, é Brasil. Somo nós e nisso somos bons, ia inconscientemente me dando conta. 
   Em 1990 havia um sentimento no ar "será que o Brasil voltará a ganhar uma Copa? Ou serão essas alegrias coisas do passado?" Fazia vinte anos do tri-campeonato no México. O clima era de tanto pessimismo que torcia-se para a seleção com um certo pesar, parecia que não ia dar. E cada gol, era uma alegria que enxia o peito de esperança.
  
   O Brasil então passa a primeira fase e vai para as oitavas de final onde enfrenta a Argentina. O cara então vai entendendo as coisas, que se o Brasil perde vai pra casa, num jogo em que enfrenta o famoso Maradona e a seleção atual campeã do mundo. Olhando pra trás percebo que foi ali, naquele jogo, que compreendi o que é realmente torcer e sofrer pelo Brasil. Foi naquela Copa e naquele jogo que me tornei brasileiro pois entendi o que isso significava. Fiquei, surpreendentemente muito nervoso. Não era um campeonato em disputa, ou meros 11 contra 11 como dizem ingenuamente. O que estava em disputa ali era a única alegria que o país era capaz de dar à seu povo e a mim. Perder aquele jogo era como perder tudo o que a gente tinha de especial, só sobrariam os prolemas, a inflação, Sarney, a tosquera, as contas, mochilas em saco de arroz, lojas com brinquedos caros, divida externa, escolas enfadonhas, o desespero de uma mesmice pobre e sem esperança. E eis que então, quase no fim do jogo Maradona lança uma bola para Caniggia, que livre passa por Tafarel e faz Argentina 1 x 0 Brasil. Aquilo doía. Mas havia tempo, podíamos empatar, levar para prorrogação. Dava até pra virar ainda. Torci, como quis que o Brasil fizesse um gol. Trocaria todas as lojas de brinquedo por um gol da seleção!
   O juiz apita fim de jogo. Meus olhos se encheram de lágrima. Ao meu lado meus tios e meu pai, todos tristes tentavam disfarçar a emoção, aparentando conformismo dizendo coisas como "tinha que perder mesmo", "bem feito, quem mandou 'não ter feito isso' ou 'aquilo'". Eu ouvia sentindo uma certa raiva deles por dizerem isso e permanecia imóvel, tentando segurar as lágrimas pra não passar vergonha, sabendo que se dissesse qualquer palavra iria cair no choro. Foi um dia triste. O dia que entendi o que era ser brasileiro foi um dia em que perdi toda a esperança no Brasil. Nada dava certo nesse país. Se existia alguma beleza em nascer, viver e torcer por esse país, era uma beleza trágica. 
   E veio Collor; veio o tetra em 2004; controlaram a inflação; FHC; a amarga final de 2008; pentacampeões em 2002; LULA; o Brasil provou ao mundo quem manda no Futebol, três finais seguidas e um bicampeonato, e em que outro país isso significaria tanto?, que alegria!; passamos de um país subdesenvolvido do terceiro mundo, para um país emergente; mensalão e muita corrupção pra variar; o cinema nacional floresce; Dilma; bons desenhos animados nacionais e uma produção cultura mais rica e diversificada; muita coisa no país melhorou, temos muito mais acesso a informação e a bens de consumo; instaura-se um clima de otimismo crescente que seria coroado com uma Copa do Mundo realizada aqui e uma Olimpíada. Muito mais do que aquele garoto brasileiro sem esperanças de 1990 poderia imaginar na época para o seu país.
  
   Entretanto, a despeito das melhorias o Brasil continua sendo o Brasil, e por ignorância, ingenuidade, safadeza e ganância muitas coisas tristes e negativas ainda tem acontecido por aqui. E é aqui que está o ponto de virada. O copo está meio cheio ou meio vazio? Podemos continuar lutando e reclamando para que os políticos melhorem o que está ruim, podemos focar nisso, ou podemos usar o que está bom como exemplo e motivação para avançarmos nós nas questões em que precisamos evoluir? Já está mais do que evidente que a política trabalha em prol de interesses particulares e não há indícios de que em algum momento isso será diferente. Quem protesta, protesta de acordo com os interesses de algum partido político, e portanto está sendo usado para que alguém conquiste ou se mantenha no poder. É o jogo sujo em que não podemos mais nos envolver. As pessoas reclamam e protestam mas elas mesmas não fazem nada para efetivamente mudar. Se indignam mas mantêm a mesma vida de olho somente nos seus interesses mais imediatos fazendo exatamente o jogo desse sistema que esperam que mude a base de reclamação. Bom senso Brasil. Se a educação está ruim quem poderia tomar uma atitude e fazer algo para melhorá-la é o professor. Quem mais se beneficia com a precariedade da saúde pública não é exatamente quem tem clinica particular, ou seja, o médico? E se o Neymar ganha mais que vc pára de achar ruim, seja tão bom quanto ele é no gramado naquilo que você faz que provavelmente seu salário ira aumentar. Protestar conta a Copa é como protestar contra o ar por causa da poluição. Se você encontra merda no banheiro você não quebra ele todo, você puxa a descarga. Bom senso Brasil!
   A Copa pode ser uma oportunidade histórica para que todos nós brasileiros juntos façamos de fato alguma coisa pelo país, por nós mesmos. Torcer pelo Brasil, esquecendo Fifa, patrocinadores, governo, atletas milionários, torcer para aquilo que sempre nos deu esperança e que sempre mostrou pra gente que apesar de tudo o que há de ruim em nossa volta, apesar de todos os nossos equívocos históricos e reincidências, apesar de todas as dificuldades e obstáculos, a gente pode vencer, a gente pode ser bom, a gente pode ser o melhor. O Brasil, pode ser o melhor país do mundo se deixarmos de lutar uns contra os outros, deixarmos de reclamar e dermos o nosso melhor cada um naquilo que mais acredita, sonha e tem vocação. E acho que essa Copa do Mundo tem o poder de despertar isso em nosso país, despertar o sentimento de irmandade e solidariedade, de vitória e superação, capaz de unir uma nação e transformá-la no país que todos nós sonhamos e merecemos. Em que poderemos dizer pra todo mundo com alegria e orgulho, sou brasileiro, sou do Brasil um país de campeões. E nada além dessa Copa do Mundo é capaz de fazer isso, nada além de torcer pela vitória da seleção em uma Copa do Mundo é capaz de unir tanto a nação e criar esse sentimento poderoso de brasilidade. É assim. A nossa história fez com que fosse assim.
  
   Se você realmente quer que o Brasil mude, que a sua vida mude, pare de reclamar, entre em campo, vista a camisa, cante o hino nacional e vamos todos ser juntos campeões, vamos todos ganhar, vamos todos ser felizes Brasil! A Copa é nossa! A nossa grande dádiva é o futebol, e agora a Copa é aqui e é a coisa mais linda que poderia acontecer no Brasil! Sei disso desde 1990 e quase me convenci do contrário em meio a todo esse turbilhão de decepção e indignação que envolveu o país nos últimos meses. Mas era mais um vez só o Brasil sendo o Brasil. O Brasil trágico e tosco, que no fim dá um jeitinho em tudo e que malandramente nos prega peças trolando nossas esperanças, mas que agora está mais consciente, cansou da avacalhação e da derrota e que com um pouco de bom senso fatalmente se dará conta de que sim somos bons, temos talentos e podemos ser realmente grandes e fortes. Esse mundial tem assim tudo pra ser um divisor de águas, entre aquele velho Brasil, corrupto, ingênuo, subdesenvolvido e vergonhoso, e um novo Brasil campeão, bonito, unido, inteligente, pra frente e exemplar. E eu acho que a gente pode. A bola tá na marca do pênalti, é só chutar direito essa bola que é gol Brasil! Uma revolução de verdade. Sejamos verdadeiros com nós mesmos e bons naquilo que mais amamos e puff, nasce um outro país. Uma Brasil Campeão. 

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